A educação brasileira está em um momento importante. Após dez anos de vigência do Plano Nacional de Educação (PNE) 2014-2024, que termina em 2025, o Brasil aguarda a aprovação de um novo plano que irá guiar as políticas educacionais até 2034. O Projeto de Lei nº 2.614/2024, encaminhado pelo Ministério da Educação à Câmara dos Deputados em junho de 2024, traz consigo tanto avanços significativos quanto polêmicas profundas que dividem especialistas, gestores e representantes da educação.
PNE 2024-2034: Conheça As 18 Objetivos Educacionais Que Prometem Transformar A Educação Brasileira Nos Próximos Dez Anos
O novo plano estabelece 18 objetivos e 58 metas, elaborados a partir de contribuições do Ministério da Educação, sociedade civil, Congresso Nacional, estados, municípios e conselhos de educação. Esses objetivos cobrem oito temáticas principais que refletem as prioridades educacionais para a próxima década.
Na educação infantil, o plano aponta para a universalização da pré-escola para crianças de 4 e 5 anos e ampliação da oferta de vagas para 60% das crianças até 3 anos em creches. A alfabetização recebe destaque especial, com meta de garantir que todas as crianças sejam alfabetizadas até o final do 2º ano do ensino fundamental, reconhecendo a importância crítica dos primeiros anos de escolarização.
Para o ensino fundamental e médio, o plano propõe a universalização do acesso para estudantes de 6 a 17 anos, acompanhada de melhorias na qualidade da aprendizagem e redução das desigualdades entre diferentes grupos sociais. A educação integral em tempo integral constitui uma meta ambiciosa: oferecer educação em tempo integral em 55% das escolas públicas, beneficiando 40% dos estudantes.
A educação digital ganha espaço importante, com a disponibilização de conectividade e formação para tecnologias digitais, preparando os jovens para os desafios do século XXI. Na educação profissional e tecnológica, o plano prevê expansão significativa das matrículas no ensino técnico de nível médio e em cursos de qualificação profissional.
O ensino superior também sofre transformações, com meta de aumentar em 40% a oferta de vagas na graduação e ampliar o número de mestres e doutores no país. Há, ainda, objetivos específicos para educação indígena, quilombola, educação do campo e inclusão de pessoas com deficiência, reconhecendo a pluralidade da sociedade brasileira.
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A Valorização dos Profissionais da Educação
Uma dimensão frequentemente negligenciada, mas essencial, é a formação e valorização dos profissionais da educação. O novo PNE enfatiza a importância de proporcionar formação continuada e condições de trabalho adequadas aos educadores, estabelecendo planos de carreira claros e estruturados. Sem investimento adequado nesse aspecto, as metas ambiciosas em aprendizagem enfrentarão obstáculos significativos.
A Polêmica Central: O Financiamento
Se as metas são ambiciosas, a mesma não pode ser dita sobre o financiamento proposto no substitutivo do deputado Moses Rodrigues, apresentado em outubro de 2025. Aqui reside a maior controvérsia do novo PNE.
O Projeto de Lei original previa um investimento público de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) em educação até 2034, mantendo a meta que constava no PNE anterior (2014-2024). Essa meta de 10% era considerada essencial por organismos internacionais e pela comunidade educacional como o patamar necessário para universalizar a educação com qualidade no Brasil.
No entanto, o substitutivo apresentado reduziu a meta de investimento público para 7,5% do PIB, com a complementação de mais 3,5% do PIB provenientes do setor privado, totalizando 11% de investimento. Essa mudança representa o que críticos chamam de um retrocesso histórico e abre caminhos para a privatização da educação.
A Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino (Contee), uma das principais organizações do campo educacional, alertou para os riscos dessa abordagem. Para a entidade, a redução do investimento público subordina a política educacional à lógica de mercado, fragiliza a oferta pública e amplia o caminho para a privatização e mercantilização da educação. Com quase 100 das 253 estratégias do novo PNE dependendo diretamente de financiamento adequado, a implementação de políticas como o Custo Aluno-Qualidade (CAQ) e a valorização de profissionais fica seriamente comprometida.
Outras Questões Polêmicas
Além do financiamento, outras lacunas preocupam especialistas. O substitutivo também adia a implementação do CAQ por mais um decênio, o que frustra expectativas de políticas mais equitativas na distribuição de recursos entre escolas e redes educacionais.
Há, ainda, preocupações sobre a meta de expansão do ensino superior. Enquanto o plano prevê aumentar em 40% a oferta de vagas, não especifica claramente se essas vagas serão exclusivamente na educação pública. Considerando que a rede privada já domina 78% das matrículas no ensino superior, a ausência de regras claras pode ampliar ainda mais a desigualdade no acesso à formação avançada.
O Legado do PNE 2014-2024
Para compreender as apostas do novo plano, é importante reconhecer o histórico do plano anterior. Segundo análise da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, apresentada em junho de 2024, 90% das metas do PNE 2014-2024 foram descumpridas. Apenas 10% foram cumpridas, enquanto 13% sofreram retrocesso. Essa estatística alarmante alimenta o ceticismo quanto à viabilidade do novo plano sem mecanismos robustos de monitoramento e recursos adequados.
Perspectivas de Aprovação
O substitutivo do deputado Moses Rodrigues (União-CE) foi apresentado à Câmara em outubro de 2025 e segue em discussão. A presidente da Comissão Especial, deputada Tabata Amaral (PSB-SP), enfatizou que o texto foi “construído a muitas mãos” e contempla todos os níveis de ensino. A expectativa é que o texto seja votado na Câmara até o início de novembro e depois na Comissão Especial antes de seguir para o Plenário.
No Senado, foram realizadas audiências públicas onde representantes da educação pública municipal e estadual defenderam um novo PNE com “financiamento consistente” e acompanhado da aprovação do Sistema Nacional de Educação (SNE), que ainda é essencial para coordenar ações entre União, estados e municípios.
Um Compromisso Nacional em Risco
O novo Plano Nacional de Educação 2024-2034 representa uma oportunidade única de transformar a educação brasileira. As metas propostas refletem ambições legítimas: alfabetização universal, educação de qualidade para todos, inclusão de populações historicamente marginalizadas e preparação para tecnologias do futuro.
No entanto, sem investimento público adequado e mecanismos eficientes de fiscalização, essas metas correm o risco de permanecerem letra morta, como ocorreu com grande parte do plano anterior. A decisão que o Congresso Nacional tomará nos próximos meses sobre o financiamento e a implementação do novo PNE será determinante não apenas para a educação, mas para o futuro econômico e social do Brasil.



